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Arão V. R. dos Santos e Vitória F. A. dos Santos

Física na Medicina

A Física é uma ciência que tem como objetivo estudar e compreender as leis da Natureza. Suas descobertas podem ser aplicadas em várias áreas do conhecimento. A Física aplicada à Medicina é fundamental para a área da Saúde, promovendo inovações tecnológicas que resultam em novos métodos para salvar vidas. Essa área é chamada de  Física Médica. Ela faz uso de princípios físicos para diagnóstico e tratamento de doenças. Nos últimos séculos foram desenvolvidos equipamentos que mudaram para sempre o diagnóstico e tratamentos de doenças. Um dos equipamentos pioneiros e um marco histórico na Física com grande impacto na Medicina foi a descoberta dos raio-X pelo alemão Wilhelm Conrad Röntgen em 1895 o que lhe rendeu o primeiro prêmio Nobel da história da fisica. Röntgen descobriu que a radiação X é capaz de penetrar várias camadas de tecidos humanos, possibilitando melhores diagnósticos de maneira não invasiva e rápida. O nome dado foi X, pois na época não era conhecida a origem dessa radiação. Os raios-X possuem um comprimento de onda muito curto, variando tipicamente entre 0,01 e 10 nanômetros (nm). Para comparação, o comprimento de onda da luz visível varia de 400 a 700 nm, o que torna os raios-X significativamente menores em comprimento de onda. Devido a isso, os raios-X possuem alta energia. Uma das primeiras imagens de raio X obtidas foi da mão da esposa de Röntgen .

                                       

                       Figura 1: Raio-X da esposa do Röntgen  (Fonte: Grego, 2020)


O tubo de raios-X é onde elétrons são acelerados a altas velocidades e colidem com um alvo feito de metal. Quando os elétrons colidem com o alvo, uma pequena parte da energia cinética é convertida em radiação X. O raio-X é, então, emitido e com o auxílio de um aparato óptico são direcionados à região corporal desejada. O raio-X é absorvido de diferentes formas por cada tecido do corpo humano, o que resulta em diferentes tonalidades na placa que recebe a radiação após atravessar o corpo. Isso facilita a distinção dos tecidos e facilita a leitura do resultado. Contudo, mesmo o raio-X oferecendo inúmeras aplicações, nenhuma delas monitora as batidas do coração. Para isso, em 1903, Einthoven desenvolveu o eletrocardiograma moderno. Ele inventou o primeiro galvanômetro de corda, um dispositivo capaz de medir pequenas correntes elétricas. A corda era suspensa entre os pólos de um potente ímã. Quando a corrente elétrica gerada pelo coração passava pela corda, essa corrente interagia com o campo magnético, fazendo com que a corda se movesse lateralmente devido à força de Lorentz (superposição da força elétrica com a força magnética). A corda em movimento refletia um feixe de luz sobre uma película fotográfica. À medida que a corda se movia com as variações da corrente elétrica, o feixe de luz também se movia, registrando essas variações na película onde poderiam ser observadas as batidas do coração. Em sua primeira versão pesava quase 300 kg e ocupava o espaço de uma sala.

Figura 2: Primeira máquina de eletrocardiograma (Fonte: MACLEOD, 1918)


Com o desenvolvimento da Eletrônica no século XX, o galvanômetro foi abandonado e, atualmente, os sistemas de eletrocardiograma utilizam eletrodos posicionados na superfície da pele para captar as batidas do coração. No século XX, onde as duas maiores guerras da história da humanidade foram travadas, a Física também foi aplicada na engenharia militar. Durante a grande guerra, Paul Langevin, um físico francês, desenvolveu o sonar para detectar submarinos, utilizando ondas de ultrassom. A tecnologia mostrou que as ondas sonoras de alta frequência podiam penetrar em materiais e refletir de volta, permitindo a localização de objetos.  Na década de 1940, médicos começaram a explorar a aplicação de ultrassom na Medicina. Karl Theodore Dussik, um neurologista austríaco, foi um dos primeiros a usar ultrassom para diagnosticar tumores cerebrais. No entanto, a ultrassonografia médica começou a ganhar popularidade nos anos 1950 e 1960, com contribuições significativas de Ian Donald, um obstetra escocês, que usou ultrassom para examinar fetos durante a gravidez.


Figura 3: Karl Dussik realizando um ultrasom (Fonte: SUDOŁ-SZOPIŃSKA, 2021)


A ultrassonografia é usada para criar imagens em tempo real dos órgãos internos, tecidos e fluxo sanguíneo. É especialmente útil para examinar tecidos moles que não são bem visualizados por raios-X, como o fígado, rins, pâncreas, e durante a gravidez para visualizar o feto sem afetá-lo com a radiação. Mesmo com essas vantagens, o raio-X continua sendo amplamente utilizado para imagens de alta precisão por sua qualidade, principalmente dos ossos. A ultrassonografia utiliza ondas sonoras de alta frequência. As ondas de ultrassom penetram no corpo e são refletidas de volta quando encontram interfaces entre diferentes tipos de tecidos, como a interface entre músculo e osso ou entre líquido e tecido sólido. As ondas refletidas (ecos) são captadas  e convertidas em sinais elétricos. 


Figura 4: Demonstração da reflexão (Fonte: HORITA, 2021)


Até a década de 1970, nenhum equipamento conseguiu mapear com precisão o cérebro, o órgão mais importante do corpo humano, até o físico americano Raymond Damadian aplicar o princípio da ressonância magnética na medicina em 1973. O princípio da ressonância magnética nuclear, que foi descoberto em 1945 por Felix Bloch e Edward Purcell, que receberam o Prêmio Nobel de Física em 1952 por suas contribuições. Eles demonstraram que núcleos atômicos em um campo magnético podem absorver e emitir radiação eletromagnética quando expostos a ondas de rádio. Damadian sugeriu que isso poderia ser usado para diferenciar tecidos do corpo humano.  Os núcleos de hidrogênio possuem um momento magnético intrínseco, chamado de "spin". Quando colocados em um campo magnético, esses núcleos alinham-se com o campo ou contra o campo, criando dois estados energéticos diferentes. 


Figura 5: Fundamentos da ressonância magnética funcional (Fonte: Gattass, 1999)



Figura 6: Fundamentos da ressonância magnética (Fonte: KOCK, 2020)


Um pulso de radiofrequência é aplicado, que perturba o alinhamento dos núcleos, elevando-os para um estado de maior energia. Após a interrupção do pulso de radiofrequência, os núcleos retornam ao seu estado de alinhamento original, liberando energia na forma de sinais de rádio que são detectados pelo aparelho. Esses sinais são processados por um computador para criar imagens detalhadas dos tecidos. As diferentes propriedades dos tecidos (como densidade e tempo de relaxamento) afetam a forma como os sinais são emitidos e detectados, permitindo a criação de imagens contrastantes.                                      

Figura 7: Emissão das ondas de rádio (Fonte: BRAGA, 2010)

                                                                        


Figura 8: Máquina de ressonância de Raymond Damadian (Fonte: SANDOMIR, 2022)


No Brasil, a Física Médica ganhou estrutura com a criação da Associação Brasileira de Física Médica (ABFM) em 1969, promovendo o desenvolvimento e a aplicação dos princípios físicos na Medicina. Uma prova avaliativa é necessária para ser certificado pela ABFM. A Física Médica é uma consequência natural da evolução da ciência moderna e da tecnologia. Ela possibilita a atuação em diversas áreas, como radiologia diagnóstica e intervencionista, medicina nuclear e radioterapia, entre outras. Essas aplicações são essenciais para a moderna prática médica, proporcionando ferramentas indispensáveis para diagnósticos precisos e tratamentos eficazes, melhorando os cuidados com a saúde e salvando vidas. Algumas das principais invenções da Física Médica foram abordadas nesse texto, não obstante, outras incontáveis tecnologias foram desenvolvidas no campo dessa ciência, como a radioterapia, radiofármacos e cirurgia a laser.


Referências:

 

MACLEOD, J. J. R. Physiology and biochemistry in modern medicine, 1. ed St. Louis : Mosby, 191.


SUDOŁ-SZOPIŃSKA, I.; MARTINOLI, C.; PANAS-GOWORSKA, M. History Page: Leaders in MSK Radiology Karl Dussik, 1908–1968: Pioneer of MSK Ultrasonography. Seminars in Musculoskeletal Radiology, v. 25, n. 01, p. 184–185, fev. 2021.


SANDOMIR, R. R. D. Creator of the First M.R.I. scanner dies at 86. The New York Times, 2022. Disponível em: https://www.nytimes.com/2022/08/17/science/raymond-damadian-dead.html Acesso em: 12 Ago. 2024


GRECO, M. Diagnostic radioentomology. intechopen, 2020. Disponível em: https://www.intechopen.com/chapters/69859 Acesso em: 12 Ago. 2024


BRAGA, N. C. Ressonância Magnética. Instituto Newton C. Braga, 2010.

Acesso em: 11 Ago. 2024


HORITA, S. A. Aprendendo sobre a ultrassonografia no sistema locomotor - a física do ultrassom. Médico Fisiatra, 2021. Disponível em: https://www.medicofisiatra.com.br/post/aprendendo-sobre-a-ultrassonografia-no-sistema-locomotor-a-f%C3%ADsica-do-ultrassom Acesso em: 11 Ago. 2024


KOCK, K. S. Kelser Kock. Ressonância magnética - Tópicos gerais. YouTube, 6 de setembro de 2020. 

Acesso em: 11 Ago. 2024


Gattass , R. et al.Fundamentos da ressonância magnética funcional. Puc Rio, 1999. Disponível em:  https://www.tecgraf.puc-rio.br/visualcortex/Fundam.htm

Acesso em: 11 Ago. 2024


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