Manchas Solares
O Sol é a estrela mais próxima de nós e, apesar do senso comum, não é apenas uma “bola de fogo” flutuando no espaço. Ele é uma esfera de gases ionizados (plasma), submetidos a temperaturas e pressões extremamente altas, e a temperatura e luz fornecidas por ele são essenciais para a sobrevivência da vida na Terra. Por isso, desde o começo dos tempos os seres humanos olham para esse astro com curiosidade, admiração, para fins práticos (cronologia) ou até adoração, buscando desvendar os seus segredos e aprender mais sobre algo tão vital para nós.
Entretanto, durante a História, analisando esse astro (mediante observação telescópica), pode-se perceber a presença de pequenas “manchas” que até então não poderiam ser explicadas pelas teorias da época (quando são descobertas por Galileo Galilei em 1613). Essa dificuldade se dava devido à crença aristotélica da perfeição e imaculabilidade dos astros celestes: se o sol era um objeto perfeito (como a comunidade astronômica acreditou por milhares de anos), não poderia possuir anormalidades ou defeitos. Essas imperfeições, que hoje chamamos de manchas solares, tem, então, grande importância histórica na revolução das ideias como efetivamente ocorreu no Renascimento.
As manchas solares são fenômenos temporários que acontecem naturalmente na superfície do sol, manifestando-se como pontos escuros gerados pelas fortes linhas de campo magnético que emanam do interior da estrela. Elas são mutáveis, podendo aumentar ou diminuir durante a sua existência, e são geralmente catalogadas diariamente e medidas em "milionésimos do hemisfério visível do Sol” (MH). Essa medida de comparação relaciona a área de uma mancha solar, que pode chegar até várias vezes a superfície do planeta Terra, com a área de superfície que conseguimos observar do Sol, ou seja, metade da sua área total de 6,08771012 km². Além disso, para melhor observar e acompanhar seu crescimento, uma mancha solar simples pode ser dividida na região chamada de umbra, em geral a região central mais escura em que o campo magnético é mais intenso, e a penumbra, parte mais clara ao seu redor, como mostra a figura 1.
Por possuírem esse grande campo magnético, além de bloquear as energias expelidas pelo Sol, essa região atua como inibidora do efeito de convecção que ocorre naturalmente na estrela. Esse efeito, que é simplesmente a transferência de calor em um fluido por meio de correntes convectivas internas, é o que transfere as temperaturas mais altas do núcleo da estrela para o exterior, aquecendo a superfície. Por isso, as manchas solares observadas são mais frias, o que dá a elas a sua aparência mais escura, um indicador de que o forte campo magnético naquela região impede a troca de calor.
A observação desses fenômenos é algo importante pois a erupção de manchas solares, processo que pode ocorrer naturalmente devido ao ciclo de atividade solar ou à interação das linhas de campo magnético, pode ejetar rajadas de radiação e material solar que podem atingir a Terra e formar as chamadas tempestades solares. Em geral, esses eventos não apresentam muitos perigos à superfície da Terra pois ela é protegida pelo seu campo magnético. No entanto, manchas maiores acabam gerando ejeções de massa coronal maiores e, portanto, é vital o acompanhamento da superfície do Sol.
Entretanto, esse acompanhamento quase que imediato, por meio de telescópios e softwares preparados para lidar com uma série de informações vindas do Sol, é um advento recente em função do avanço da tecnologia de observação espacial. Porém, como citado anteriormente, a descoberta das manchas solares é um importante fator histórico e, portanto, é necessário acompanhar qual foi o processo de observação dessa estrela durante a evolução da civilização humana.
Estudos aprofundados sobre o histórico das observações das manchas solares mostram que elas começaram, obviamente, muito antes do telescópio ser criado. Os orientais, em especial chineses, foram um dos pioneiros nesse assunto, quando, desde 1000 a.C., eles observavam o sol a olho-nu, visto que na Europa, por exemplo, os registros mais antigos desse assunto foram feitos em 807 d.C. e, para que os orientais pudessem observar, eram necessárias condições favoráveis, como poeira e nebulosidade para que a luz do sol não fosse tão forte a ponto de atrapalhar a observação. Porém, existem teóricos que afirmam que os orientais já se utilizavam de filtros artesanais.
Lorensi e Pacini trazem em seu artigo um gráfico que mostram os 150 registros de manchas solares feitas por chineses e coreanos entre 165 a.C. até 1610 d.C. e que foram catalogadas no acervo oriental, como mostra a figura 2, no qual podemos notar que, em meados de 1400 d.C., foi quando houve a maior frequência de manchas solares observadas.
Com o passar dos anos, um mecanismo chamado de câmara escura foi criado e os astrônomos começaram a utilizá-lo para tal propósito. A câmara escura é um instrumento óptico onde em uma caixa escura há uma pequena abertura em que a luz entra e transmite a imagem para a parede oposta invertida. O primeiro desenho do sol observado a partir da câmara escura foi de Reinerus Gemma Frisius e a partir dele vários outros cientistas fizeram a uso da câmara escura (figura 3), como, por exemplo, Johannes Kepler que foi o primeiro a observar uma mancha solar com o instrumento, no qual ele atribuiu erroneamente ser o trânsito de Mercúrio devido ao grande tamanho da mancha solar observada.
No século XVII, com o advento do telescópio, o uso de câmaras escuras foi caindo em desuso, sendo Galileo Galilei o primeiro a usar esse instrumento para observação solar em 1611.
Hodiernamente, os telescópios são bem mais sofisticados e pensados para proteção ocular, uma vez que a radiação emitida pelo sol afeta diretamente a visão humana. Hoje, as observações astronômicas se dão de forma indireta (projeção) ou direta, mediante usos de filtros.
As observações indiretas são realizadas por meio de reflexão na água, projeção pin-hole - que nada mais é que uma câmara escura - e projeção por reflexão. A reflexão na água deve ser feita de maneira curta e quando o sol não está muito próximo do horizonte para que a visão não seja prejudicada, enquanto a projeção por reflexão é realizada com um espelho que reflete a imagem em um anteparo ou até mesmo com um telescópio que faz o papel do espelho.
Agora as observações diretas são feitas com o próprio telescópio (projeção) ou com um binóculo provido de filtros solares. Para observações astronômicas amadora pode-se utilizar um vidro de máscara de soldador de número 14 ou maior, para a proteção contra as radiações solares.
Referências:
O que são manchas solares? Space Weather Live, 2024. Disponível em: https://www.spaceweatherlive.com/pt/ajuda/o-que-sao-manchas-solares.html. Acesso em: 27/07/2024.
Tolentino, R.J.V. Sobre manchas solares. Astronomia no Zênite, 2016. Disponível em: https://zenite.nu/sobre-manchas-solares. Acesso em: 27/07/2024.
CÔRREA, G. M. Observação do sol. Observatório Astronômico Frei Rosário UFMG. Disponível em: http://www.observatorio.ufmg.br/dicas-de-observacao/observacao-do-sol/observacao-do-sol.html#topo. Acesso em: 27/07/2024.
LORENSI, C; PACINI, A. A. Observações das manchas solares - uma história antiga. Revista Univap, 2016.
OLIVEIRA, G. M. Sobre as manchas solares de Galileo Galilei. In: NEVES, M.C.D.; ZANATTA, S.; TROGELLO, A.G. Conhecimento público e Educação tutorial. Maringá: Editora LCV, 2017.
SILVA, C. C. Desenhos feitos por Galileo em 1610 mostrando as manchas solares. Researchgate. Disponível em: https://www.researchgate.net/figure/Figura-8-Desenhos-feito-por-Galileo-em-1610-mostrando-as-manchas-solares-Fonte-Ref_fig6_262457619. Acesso em: 27/07/2024.
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